Divulgar idéias próprias, combater o discurso invertido corrente, aprender a dividir, expor sentimentos,
trazer poesia ao dia-a-dia, eis a abrangente ação deste veículo de idéias. De tudo, um pouco - minha meta.
 

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28.3.03
 
Hoje, fiz força para não ler notícias de guerra. São difíceis de digerir e me deixam avassalada. Destruição, sangue, desespero... Crianças em sofrimento... Fogo, medo, dor, exaustão, desesperança... É duro demais. Baixemos a cortina por um dia pelo menos, mudemos a cena. Falemos de coisas leves, de amizade, de felicidade que certos gestos, quase sempre discretos, às vezes imperceptíveis nos causam. É que hoje recebi demonstrações de afeto, de respeito e carinho de diversas pessoas, em horas diferentes, por motivos diferentes também. E percebi que nada alimenta mais o íntimo da gente do que essas pequenas remessas
de apreço, de bem-querer desinteressado. Um jato de felicidade em meu eu tenso e descontente com o clima que ameaça paz de todos nós.
Precisava haver a Internet para criar a possibilidade de afinidade entre pessoas que nunca se viram. E como tiramos desse fato momentos positivos de entendimento, de alegria, de ternura, de satisfação, de festa, de união! Parte dos motivos da minha satisfação de hoje deriva de contatos cibernéticos.
Um brinde a meus companheiros de rede através da poesia bonita de uma amiga que, por acaso, hoje me fez feliz com seu jeito delicado e sua palavra cativante.

ESPERA

Lêda Mello


Calmamente,
passam as águas.
O marulhar ingênuo,
hipnótico,
profético,
faz compasso
para o tempo que passa
no descompasso
do meu tempo.


Um vento forte
encrespa as águas.
À minha frente,
a melancolia
da paisagem estática.
Nada acontece.
O marasmo
provoca
um ensaio de aflição.
O tempo passa.
A vida passa.
Permaneço sentada.
Minha cadeira não tem rodas.
Não sai do lugar.
Esqueceram de vir me buscar.


Obrigada, amigos, que me deixaram contente. Sinto-me mais forte para acompanhar o desenrolar da guerra.
Um fim de semana proveitoso para todos. Até.







publicado por Magaly Magalhães às 12:59 AM
21.3.03
 
"É IMPOSSÍVEL DEIXAR DE LAMENTAR OS DESATINOS DA HUMANIDADE QUANDO, MAIS UMA VEZ , ELA SE LANÇA AO PRECIPÍCIO."

Está no artigo "A MARCHA DA INSENSATEZ" de Cora Rónai, no Segundo Caderno de O Globo de hoje, 20 / 03 / 03.

Eu não conseguia crer que esta guerra seria levada a cabo. Até a última hora, esperei que algo sustasse esse ato de insensatez, como bem disse Cora. Infelizmente, fui forçada a acreditar quando, diante da televisão, assisti ao primeiro bombardeio sobre Bagdá.

Onde os princípios humanísticos que deveriam nortear o homem? De que serve o progresso científico em todas as áreas do conhecimento humano se, para a solução de problemas externos, ainda é válida a demonstração de força e abuso de poder? Não se massacra uma população sem condição de fuga para devolver-lhe a liberdade.

As nações líderes do mundo tinham que ter encontrado um meio de depor o ditador iraquiano antes que a nação mais bem armada do mundo agisse ditatorialmente, como está acontecendo. Quais serão os corolários desta demonstração? Olho com espanto e angústia o fantasma de uma ditadura planetéria. E a massa alienada de americanos, anestesiada da maneira como fala nossa indignada Cora, pode muito bem servir aos fins beligerantes deste insensato governo dos EEUU.

Que a sensatez aflore nas mentes responsáveis dos homens que ainda têm voz no concerto das nações e guie a humanidade para uma ação de desarmamento total. Só assim, poderemos vislumbrar a possibilidade de paz definitiva no universo.


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Para não deixar de trazer poesia, mesmo neste inexorável clima de guerra, achei entre os Esparsos e Inéditos de Mauro Faustino, o poeta ligado à idéia de morte, por excelência, este lindo poema sem título :

...

Túnel, pedra, tonel
A mão sem luva,
a mão com chaga.
Mundo que sobe e desce,
mundo que sofre e cresce.
Mundo que principia, medra e finda,
mundo de fel e mel,
túnel, pedra, tonel.

E as dobras fartas
do manto sono
tombando em torno
do leito tempo --

e os dobres fortes
do pranto sino
trocando em turnos
de luto e vento --




No fim do túnel, o pricípio do túnel.
Na subida da pedra, a descida da pedra.
O túnel não tem fundo, a mão não chega às uvas --

Lida, caixão e sorte,
vida, paixão e morte.


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Enfrentemos o sofrimento pela guerra. Oremos pelos que estão lutando. Esperemos em Deus que não dure demais.
Até breve.








Para não deixar

publicado por Magaly Magalhães às 1:53 AM
14.3.03
 
14 de março - Dia nacional da poesia .

Comemorar? Só com poesias que nos tocam magicamente a alma, nos causam deleite ou êxtase, nos exibem as dimensões da vida.

O difícil é fazer uma seleção :

MURMÚRIO

Cecília Meireles

Traze-me um pouco das
sombras serenas
que as nuvens transportam
por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
- vê que nem te peço alegria.
Traze-me um pouco da
alvura dos luares
que a noite sustenta
no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
- vê que nem te peço ilusão.
Traze-me um pouco da tua
lembrança, aroma perdido,
saudade da flor!
-Vê que nem te digo -
- esperança!
- Vê que nem sequer
sonho - amor!

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SOBRE A TROVA

Tudo é trova: a flor, a onda
A nuvem que passa ao léu
E a lua, trova redonda
Que a noite canta no céu!

Ah, trova com que me enleio...
- Tens um gingado qualquer
Que lembra esse bamboleio
Do corpo de uma mulher...

A todos prende e cativa
E não se rende a qualquer...
- É pequena, mas esquiva...
... Não fosse a trova, mulher...

J.G. de Araújo Jorge

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SONETO DA FIDELIDADE

Vinícius de Moraes

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

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SILÊNCIOS

Augusto Frederico Schmidt

Estes silêncios que chegam sobre os nosos males,
Este gelo que nos invade subitamente,
Este cansaço que sinto crescer em ti,
Toda esta melancolia surda que nos separa,
Não vem do nosso amor.
Nosso amor está guardado pelos sete anjos:
Os sóes não o poderão queimar,
A sombra e o tédio não o poderão envolver
o cansaço não o poderá tomar,
Porque ele não é do tempo.
Sofremos: é a angústia de nos sentirmos
separados do nosso amor.
Sentimos: é a fadiga,
porque vamos subindo a sua procura.
E estes silêncios são a poeira
que desce dos grandes movimentos
Que o nosso amor realiza para além do tempo.

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A APRENDIZAGEM AMARGA

Chega um dia em que o dia se termina
antes que a noite caia inteiramente.
Chega um dia em que a mão, já no caminho,
de repente se esquece de seu gesto.
Chega um dia em que a lenha já não chega
para acender o fogo da lareira.
Chega um dia em que o amor, que era infinito,
de repente se acaba, de repente.

Força é saber amar doce e constante
com o encanto de rosa alta na haste,
para que o amor ferido não se acabe
na eternidade amarga de um instante.

THIAGO DE MELLO

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Deu para abastecer a alma? Espero que sim.
A poesia é compasso, é ritmo de vida.

Até outro dia.





















publicado por Magaly Magalhães às 11:46 PM
10.3.03
 
'"Borboleta é pétala que voa."

"A mais bela música do mundo é o silêncio interestelar."

"Era uma vez uma menina suave, leve e linda e que tinha voz de pena de pássaro."

É, sim, Clarisse Linspector que marcou nossa literatura com suas geniais produções. Aqui, um "livro-música"; ali, mistério no ar ; alhures, uma visão esplendorosa, a selvageria de um coração, uma estrela e sua hora - um grande acervo de idéias compondo uma bela bibliografia.
Seu livro mais belo, "A Hora da Estrela". Seu livro de maior impacto, "Água Viva".
Sobre "Água Viva" (Rio de Janeiro, Arte Nova,1973), o depoimento de Alberto Dines é contundente :

"É um contato com o bonito-puro."

"Você venceu o enredo, libertou-se do incidente, do evento, do acontecimento. Mas mesmo sem estes o livro prende e se enovela porque dentro da abstração há uma série de vivências muito nítidas e muito lindas. A gente vai encontrando a todo instante situações-pensamento e se identificando com elas..."

"É menos um livro-carta e, muito mais, um livro-música. Acho que você escreveu uma sinfonia. É o mesmo uso do tema principal desdobrando-se, escorrendo até transformar-se em novos temas que, por sua vez, vão variando etc etc.


Sobre a Hora da Estrela, Dines escreveu : "Já li A hora da estrela - você é a única escritora brasileira que a vislumbrou. Mas para isto tem que haver uma alma judia fazendo perguntas tão embaraçosas e perplexas."


Para rematar, fica aqui a impressão deixada em Carlos Drummond pelo livro "Onde estiveste de noite"(Arte Nova, 1974 Rio de Janeiro).

- Onde estivestes de noite
que de manhã regressais
com o ultramundo nas veias,
entre flores abissais?

- Estivemos no mais longe
que a letra pode alcançar:
lendo o livro de Clarice,
mistério e chave do ar.


Os depoimentos sobre as citadas obras de Clarice são trechos tirados de CORRESPONDÊNCIAS / CLARICE LINSPECTOR (Rio de Janeiro, Rocco, 2002)


Escolhi Clarice para homenagear a Mulher cujo dia é comemorado a 8 de março.








publicado por Magaly Magalhães às 3:32 AM
2.3.03
 
Terceiro mês do ano! O tempo corre muito rápido! E o mês entra com o Carnaval e sua retumbante folia. Que os que podem brincar façam-no e extravasem sua alegria. Pena que um ingrediente muito importante esteja sendo ameaçado - a espontaneidade dos foliões. Com esses ataques a ônibus em que passageiros, motoristas e trocadores tornam-se vítimas indefesas de insanos incendiários, essas ruas fechadas para assaltos indiscriminados, essas batalhas de rua entre traficantes e policiais, tudo isso amedronta a população. Mas o Carnaval está aí vivo, vai mostrar a sua face alegre à crueldade dos tiranos do Mal e deslumbrar o mundo com suas luzes, cores e ritmos.
Fico por aqui, hoje. Blogueiros, como toda gente, vão certamente ter outras opções para esses dias. Queria só dar meu alô e desejar a todos um Carnaval sem sustos.

Ô jardineira, por que estás tão triste?
Mas o que foi que te aconteceu?
Foi a Camélia que caiu do galho,
Deu dois suspiros e depois morreu.

Vem, jardineira, vem, meu amor,
Não fique triste, que este mundo é todo teu,
Tu és muito mais bonita
Que a Camélia que morreu.

É...se a tendência é resgatar as marchinhas antigas, está aí uma para recordar e servir de estímulo aos que gostam de homenagear em versos e som as festas carnavalescas.

Adeusinho, bom Carnaval!

publicado por Magaly Magalhães às 12:40 AM